Matéria Especial | GVPCom News
Por Lívia Ribeiro e Marcello Sampaio
Paraná — O que começou como um ataque homofóbico nas redes sociais se transformou em um ato de coragem, afeto e resistência. William, um garoto de apenas 11 anos, morador de Guaratuba, litoral do Paraná, tornou-se o centro de uma discussão nacional sobre família, diversidade e educação ao rebater um comentário preconceituoso contra seus pais, um casal homoafetivo. Com um vídeo direto, sincero e carregado de orgulho, ele viralizou ao mostrar que o “mal exemplo” apontado por uma internauta era, na verdade, um exemplo de cuidado, organização e amor familiar.
Tudo começa com um ataque
Uma usuária das redes sociais publicou um comentário homofóbico em um dos vídeos da família de William, sugerindo que o casal de pais dava um “mal exemplo” à criança e questionando onde estaria o Conselho Tutelar. A mensagem veio acompanhada de emojis de nojo, reforçando o preconceito.
Mas William, longe de se abalar, decidiu responder. Em um vídeo de pouco mais de dois minutos, ele passeia pela casa e mostra o que chama de “mal exemplo”: uma geladeira cheia, um lar limpo, frutas, legumes, produtos de higiene, brinquedos e um quarto arrumado. Com tom firme e naturalidade, o menino desmonta o estereótipo de abandono ou negligência. “Isso é mal exemplo? Meu pai comprou uma pipa pra eu brincar e não ficar só no celular. Isso é amor”, diz ele.
A família por trás da fama
Cristiano, de 33 anos, pescador e pai de William, conta que começou a produzir vídeos após uma separação traumática. “Tava na sofrência e resolvi gravar algo com meu filho do meio. A internet abraçou a gente”, relembra. Hoje, ele é casado com Jorge, de 36 anos, e juntos criam os três filhos: Marielle (13), William (11) e Isaac (9).
A família ficou conhecida pelo tom leve, espirituoso e afetivo com que abordam temas do cotidiano e tabus sociais. Os vídeos geram empatia, mas também críticas severas. Cristiano explica: “A gente faz humor, mas o preconceito ainda é grande. Só que aprendi a usar isso como ferramenta. Os haters geram engajamento.”
Depoimentos: vozes que defendem e criticam
“Nunca vi uma criança falar com tanta propriedade sobre a própria casa. O William mostrou o que é ser educado no amor.” — Renata Diniz, pedagoga e especialista em educação inclusiva
“A estrutura familiar não é o problema. O problema é a intolerância de quem não aceita o diferente.” — Diego Rocha, psicólogo familiar
“Isso é normalizar o anormal. Criança precisa de pai e mãe, homem e mulher. Essa família é disfuncional.” — Roberta L., usuária do Facebook, em comentário ao vídeo
“Fico feliz de ver crianças assim sendo cuidadas. Melhor do que muitos lares heteros que só tem violência e abandono.” — José Augusto, avô e seguidor da família nas redes
O peso do preconceito e a resposta com humor
Em outro vídeo, William aparece coberto de tinta preta, tentando assustar o pai. A brincadeira, inocente, resultou em mais ataques: na escola, colegas o chamaram de “macaco”. Jorge, o outro pai, relata: “Fomos à escola e conversamos com direção, pedagoga, todos. Foi resolvido, mas não é fácil.”
A família tem como estratégia o humor, inclusive em temas sérios. “Quando digo que quero que meu filho seja gay igual ao pai, é pra mostrar como é ridículo impor desejos aos filhos. As pessoas sonham pelos filhos. Eu quero que ele seja feliz. Só isso”, afirma Cristiano.
Influência positiva
Diversas mensagens chegam à família diariamente. São pessoas agradecendo por mostrarem que é possível viver em paz, mesmo sendo diferentes.
“Eu tava em depressão porque meu filho saiu do armário. Vi um vídeo do William e entendi tudo. Hoje acolho meu filho com orgulho.” — Sandra Moraes, mãe de adolescente LGBTQIA+ em Cascavel (PR)
“Eu trabalho com assistência social e nunca vi crianças tão bem cuidadas. Essa família é modelo pra muitas que se dizem ‘tradicionais’.” — Luciana Veloso, assistente social
O debate não acabou
Apesar do apoio massivo, as críticas continuam. Algumas lideranças religiosas acusaram a família de “promover comportamento imoral”. Grupos conservadores nas redes sugerem que a exposição das crianças seja investigada.
Para Cristiano, o mais importante é manter a transparência: “A gente não esconde nada. Eles têm escola, saúde, amor e atenção. Estão sendo preparados pra um mundo que ainda é cruel. Mas a gente vai mudando isso um vídeo de cada vez.”
A história de William não é apenas sobre uma resposta a um hater. É sobre identidade, coragem, e a capacidade que uma família tem de resistir com dignidade. O garoto de Guaratuba se tornou voz ativa num debate essencial: o direito de cada criança crescer cercada de amor — independente da configuração familiar.
Por Lívia Ribeiro e Marcello Sampaio
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