Por Marcello Sampaio – Jornalista Investigativo | Portal GVPCOM News
Araucária (PR) – Uma em cada cinco consultas e exames agendados na rede pública de saúde de Araucária não é realizada porque o paciente simplesmente não aparece. Esse dado alarmante, obtido com exclusividade pelo Portal GVPCOM News, revela um quadro crítico e silencioso que impacta diretamente a qualidade do atendimento e aumenta a fila de espera por serviços essenciais.
Somente no mês de maio de 2025, foram registradas 9.674 faltas em consultas, exames e procedimentos nas unidades do município. A taxa média de absenteísmo gira em torno de 20%, número considerado acima do tolerável por especialistas da área.
Linha do tempo: o crescimento de um problema ignorado
- Janeiro a março de 2025 – Relatórios internos da Secretaria Municipal de Saúde (SMSA) já indicavam aumento nas faltas, mas nenhuma campanha ou estratégia concreta foi adotada para conter o avanço do absenteísmo.
- Abril de 2025 – A Coordenação de Informação em Saúde emite alerta à Secretaria: mais de 7 mil procedimentos estavam sendo perdidos por mês.
- Maio de 2025 – O número atinge o pico de 9.674 ausências. Unidades de referência como a UBS Costeira e o Centro de Especialidades registram índices que ultrapassam 24%.
- Junho de 2025 – Após a repercussão dos dados, a SMSA inicia apelos à população para que evite ausências injustificadas, mas sem anunciar medidas efetivas de combate.
Números que impactam vidas
Os dados obtidos via sistema interno da Prefeitura detalham o cenário por setor:
- Atenção Primária: 35.005 agendamentos / 6.096 faltas (17,41%)
- Atenção Especializada Ambulatorial: 8.991 consultas / 1.968 faltas (21,89%)
- Atenção Psicossocial: 1.434 agendamentos / 276 faltas (19,25%)
- Exames: 6.995 agendados / 1.334 não realizados (19,08%)
Entre as unidades com maiores índices de ausência:
- UBS Costeira: 751 faltas de 3.126 agendamentos (24,02%)
- CTA/SAE: 26,30% de ausência
- Centro de Especialidades Terapêuticas: 24,37%
- CAPS Infantojuvenil: 24,07%
O que dizem os usuários do sistema?
Apesar das faltas, a população também enfrenta dificuldades reais de acesso ao atendimento médico. O Portal GVPCOM News ouviu relatos de usuários do sistema que denunciam a falta de médicos em plantões, especialmente nas Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e no Hospital Municipal de Araucária (HMA).
“Minha mãe ficou cinco horas esperando no HMA com dor no peito. Falaram que o médico estava em ‘intervalo’. Se a gente falta, eles reclamam, mas quando a gente vai, não tem atendimento”, disse Ana Paula Miranda, moradora da região do Tupy.
“Fui marcar uma consulta na UBS Industrial e só tinha vaga para daqui a 45 dias. Não é que a gente não quer ir, é que o sistema também não ajuda. Já perdi consulta por falta de ônibus no horário”, relatou o pedreiro Marcos Valença.
Prejuízo ao erário e gargalos no sistema
Além do impacto na saúde da população, o alto índice de ausências gera prejuízos financeiros ao município, que destina recursos para atendimentos que acabam não acontecendo — desperdício de tempo de profissionais, estrutura física, insumos e logística.
Para Cleverson Lezainski, coordenador do Núcleo de Informação em Saúde da SMSA, o problema poderia ser amenizado com um simples gesto:
“É fundamental que o cidadão avise com antecedência quando não puder comparecer. Isso permite que outro paciente seja encaixado e evita o desperdício da vaga.”
Faltas x Falta de estrutura: um ciclo perverso
Especialistas ouvidos pela reportagem apontam que o absenteísmo é sintoma de um sistema desorganizado, que falha em comunicação, agendamento e oferta de horários adequados à rotina dos cidadãos.
“O município precisa digitalizar o agendamento, oferecer confirmação por SMS ou WhatsApp e criar um sistema de encaixe dinâmico. Hoje tudo é engessado. Isso desestimula o comparecimento e piora a percepção de qualidade do serviço”, aponta a médica sanitarista Adriana Moreira.
Sem campanha, sem solução
Até agora, a Secretaria Municipal de Saúde não lançou nenhuma campanha de conscientização ampla, tampouco apresentou um plano estruturado para reduzir as faltas. Segundo apuração do GVPCOM News, a equipe da SMSA trabalha com recursos limitados e sem integração com o setor de comunicação da Prefeitura, o que dificulta ações preventivas.
Um sistema doente de ambos os lados
Enquanto quase 10 mil pessoas faltam por mês, outras milhares ficam à espera de uma chance de atendimento. A conta da omissão — tanto da população quanto do poder público — vai parar no bolso de todos: mais filas, menos eficiência e piora na saúde coletiva.
O momento exige mais que um apelo da Prefeitura. É necessária uma revisão urgente na forma de agendamento, campanhas de educação em saúde, ampliação da oferta médica e responsabilização mútua para garantir que o SUS em Araucária não entre em colapso silencioso.
Reportagem exclusiva: Marcello Sampaio
Depoimentos colhidos entre os dias 1 e 4 de junho de 2025
Edição: Redação GVPCOM News
Contato da redação: redacao@gvpcomnews.com.br
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